quarta-feira, 28 de agosto de 2013

Segunda parte - Depoimento dos adictos / Primeiro encontro 'Projeto Vida Nova' : A dependência química e seus aspectos físicos, mentais e espirituais

Antonio Dias ao centro com: Pamela, Dodô, Ana, Gerson, Inês, Gilmar, Bernardo e André


Segunda parte – Depoimentos de adictos (usuários e ex-usuários de drogas)

“A dependência química e seus aspectos físicos, mentais e espirituais”

1º Encontro Projeto Vida Nova – Realizado pela Casa de Oração Missionários da Luz
Local: Obra da Casa de Repouso Nosso Lar em São José dos Campos em 17/08/2013


Todos agradeceram a oportunidade de poder estar ali, e abrir seu coração, afinal não é nada fácil expor-se... cada um fez uma apresentação, e depois a platéia fez perguntas a eles.

‘Dodô – 40 anos – reside em São José dos Campos/SP’

Começou a beber quando ainda era muito jovem, e acha que a bebida é o carro chefe para as drogas, que o levou a ‘loucura’! Acredita que o adicto tem dificuldades em assumir seus erros, defeitos de caráter, e costuma manipular as pessoas, ele mesmo diz ter feito isso com os pais para usar drogas. Está a 16 anos ‘limpo’, graças à esposa, e a Deus! Os Narcóticos anônimos com os ’12 passos’ também ajudaram muito. Hoje ele percebe tudo que fez, e cuida bem do seu lado espiritual. Hoje consegue olhar nos olhos das pessoas, e entende que existe vida após as drogas, está muito feliz, tem brilho que antes não existia, pois estava depressivo. Vive um dia de cada vez... Acredita que as pessoas que nos amam, são aquelas que apontam nossos problemas e defeitos para nos ajudar, e que verdadeiros amigos são aqueles que falam a verdade na sua frente mesmo que magoe, mas também te defende quando não está presente. “As pessoas devem procurar ajuda, pois a vida sem as drogas é uma maravilha!”

Fé: é espírita, e a religião é super necessária, principalmente o ‘orai e vigiai’.

‘Pamela – 26 anos – reside em São Paulo/SP’

É usuária de drogas, como maconha, cocaína, crack. Quando era pequena, conviveu com uma mãe que traficava drogas e a usava nas diversas funções do meio, e depois que a mesma foi presa, ela foi viver com outros parentes. Às vezes pede a Deus para morrer, pois simplesmente não quer mais usar, não agüenta mais... mas depois acaba voltando a usar. Tem um filho pequeno, e não quer isso para ele... “Pais, conversem com seus filhos sobre drogas, mostre a eles os resultados, senão quando tiverem problemas, procurarão ajuda na rua!”

Fé: você geralmente lembra-se de Deus quando acorda e está na miséria...

‘Ana – 32 anos – São José dos Campos/SP’ 

Começou a usar drogas aos 15 anos. É homossexual, sofreu muito bullying na escola e em casa, se sentia rejeitada e excluída. Viciada, mal ficava na casa dos pais, ia para comer e trocar de roupa, ou buscar coisas para vender para trocar por drogas. Resolveu sair de casa, mas acabou morando na rua, virou prostituta, sofreu abusos e agressões. A droga roubou sua dignidade, seu respeito. Abandonou os estudos, o grupo musical que participava, simplesmente perdeu tudo. Há cinco anos, pesando 30 quilos achou que ia morrer, então resolveu pedir ajuda. Nunca mais quer passar pelo que passou, seu maior medo era que sua mãe falecesse e não a visse recuperada. Hoje, agradece o apoio da mãe, e dos familiares. Esta casada, trabalha, e está muito feliz! Tem um grande sentimento de gratidão por ter onde dormir, por ter o respeito das pessoas. Mas, sente as seqüelas da droga, seus pensamentos são lentos e tem uma personalidade infantil. Tem vontade de voltar a estudar, mas sente insegurança por ter dificuldades. Acredita que crescemos pelo amor ou pela dor, que as pessoas têm medo e orgulho de pedir ajuda, ela inclusive, mas sabe que só assim consegue manter-se firme. “Não posso me esquecer de onde eu vim, e onde estou hoje”.

Fé: sente-se um pouco confusa em questão a religião, já freqüentou várias, acredita acima de tudo em Deus, e hoje procura respostas no espiritismo.

‘Gerson (Maguila) – 48 anos – reside em São Paulo/SP’

Era trabalhador, mas perdeu tudo por causa do vício. Morou por muitos anos na rua, fumava, bebia e começou nas drogas com a maconha, depois cocaína... Pediu com muita fé que Deus o ajudasse, e sozinho deu o primeiro passo. Entrou para Igreja Metodista, que o recebeu muito bem, foi a família que ele não teve! O Antonio Dias o apoiou muito. Hoje acredita que ele que tem que querer se cuidar, senão ninguém fará isso por ele. Reforça a importância dos pais conversarem com seus filhos sobre o assunto. Hoje está há dois anos limpo, esta trabalhando registrado, percebe as seqüelas das drogas e do tempo que morou na rua: seus nervos das pernas estão atrofiados, e tem dificuldades para andar. “Cada um de nós aqui poderia estender a mão àquelas pessoas que muitas vezes não tem família, somos todos iguais, serem humanos!”

Fé: foi através da dor que a procurou, e a Igreja Metodista o ajudou a sair das drogas, o acolheu.

Perguntas e respostas aos adictos


‘Gilmar (Cowboy) – 46 anos – reside em São Paulo’

Era morador de rua, e sempre tinha uma cachaça ao lado para esquentar, e estar no bar com uma musiquinha era sua alegria. Hoje parou e não sente mais vontade nenhuma de beber. Foi ajudado pela igreja, é muito agradecido por isso. “Tem muita gente boa por aí... que ajuda as pessoas”. Cantou uma música em louvor a Deus, seu maior exemplo, pois morreu por nós na cruz...

Fé: quando estava na rua nunca deixou de acreditar em Deus, e foi justamente a Igreja que o ajudou a sair daquela situação.

‘André – 40 anos – reside em São José dos Campos’

É casado e pai de 4 filhos. É um adicto em recuperação. Começou aos 17 anos (cerveja, cocaína, crack...) para ser ‘descolado’, para estar nas melhores festas. Acha que é difícil sentir alegria nessa situação, e acha que a maioria acaba não procurando ajuda. Mas ele encontrou nos Narcóticos anônimos, onde cada adicto possui um ‘padrinho’ que os apóia e auxilia em todos os momentos. Hoje sente os efeitos da droga, sente-se estacionado no tempo, com atitudes de adolescente, e às vezes esquece as coisas com facilidade. Também sente algumas dores físicas. “É difícil olhar para vocês e compartilhar essa parte da minha vida de derrotas, quem sabe na próxima vez será de vitórias!”

Fé: o adicto tem muita fé, pois pede a Deus para ter a droga!!! Mas só o conhece de verdade quando consegue sair, vencer as drogas, com ele foi assim, e hoje é evangélico.

‘Bernardo – 33 anos – reside em São José dos Campos’

É adicto a mais ou menos 13 anos (bebida e drogas). Já teve épocas em que enganou a família e amigos para obter drogas, e era muito agressivo. Está a oito anos buscando recuperação, pois cansou desta vida, antes não tinha forças para sair daquela situação, esteve preso, mas não recebeu uma carta se quer de ninguém, apenas o apoio incondicional da família, que inclusive freqüentou grupos de ajuda, e principalmente o carinho e amor do pai, e sentia-se mal, pois achava que estava acabando com a vida dos pais lá fora. Sua mãe mesmo dizia que talvez fosse melhor ele morrer pois era terrível vê-lo naquela situação, então quando saiu da reclusão, resolveu buscar uma vida nova. Antigamente sonhava com certas coisas, queria conquistar bens etc, mas sem lutar, sem se esforçar. Hoje vem tentando trabalhar e dar o melhor de si, vivendo um dia de cada vez! “Hoje tenho consciência de que meus pais fizeram tudo o que puderam, pois me amavam, isso mexeu comigo, e graças ao amor deles estou lutando, sei que não estou mais sozinho, e estou aceitando e acreditando no tratamento”. Ele agradece a todos por ouvirem-no, e de certa forma gostaria de gravar tudo que disse para não esquecer.

Fé: já freqüentou Igrejas, inclusive em internações, mas teve muita dificuldade em acreditar. Hoje está começando a conhecer o espiritismo, se identificando mais com esta filosofia.

Gráfico demonstrativo do consumo de drogas lícitas (tabaco e álcool) e ilícitas (maconha, cocaína, crack etc)


‘Inês (Loira) – 45 anos – reside em São Paulo’

Saiu de casa ainda muito jovem para morar com um homem mais velho, que com o tempo mostrou-se um grande mau caráter, mentia para ela, a maltratava, sempre estava bem vestido e com muito dinheiro, com o tempo ela descobriu que ele era ladrão, e através dele ela experimentou as drogas, e acredita que este homem a transformou em uma pessoa ruim, ‘pior do que ele’. Tornou-se usuária e traficante de drogas, comandou várias comunidades na zona norte de São Paulo, e ficou bem conhecida na região. Trocou tiros com a polícia diversas vezes, intermediava fatos na comunidade. Acredita que quando você está no mundo das drogas não consegue enxergar as coisas boas, quando você passa por frustrações tem vontade de usar, mas ela é maldita, ela tira você da realidade, e depois sente ‘brancos’. Diz que as pessoas viciadas não usam drogas para roubar, e sim o contrário, pois quando está drogada, está anestesiada, não tem poder de reação, perde inclusive os sentimentos, por isso acaba destruindo famílias.

Foi presa mais de uma vez, torturada, viveu um verdadeiro inferno na cadeia, mas lá dentro conheceu uma senhora que ‘colocou sonhos em sua cabeça’, mostrou que ela era inteligente e poderia ter uma vida diferente quando chegasse aqui fora. Ela saiu do vício sozinha, por que quis parar, freqüenta a Igreja, mas acredita que muitas pessoas gostam dessa vida mesmo vendo as pessoas em sua volta sofrendo. Teve sete filhos, uma deficiente que faleceu recentemente. Estes mesmos a ajudam até hoje com os bicos que faz para sustentar a família, já que largou o tráfico.

Afirma que o traficante alicia os jovens oferecendo a droga, dizendo que vão se sentir bem, por isso diz aos pais que conversem sempre com seus filhos, e que não tenham medo de falar com eles sobre drogas, que olhem nas coisas deles, perguntem aonde vão e com quem andam, e que revejam seus comportamentos, pois muitas vezes fumam e bebem na frente deles, não podendo assim exigir o contrário. Mostrem a realidade a eles, não dêem tudo que eles pedem, prestem atenção nos sinais. O traficante oferece à criança carente aquilo que ele não pode ter (roupas boas, bens materiais, comidas diferentes...), por isso muitos se envolvem nessa teia, e os pais que deixam as crianças soltas na rua perdem seus filhos para eles. O dependente químico deixa a família toda doente! Por uma vez pensou: se alguém vender drogas para meus filhos, eu mato! Mas... eu vendo drogas para os filhos dos outros!!!!

Quando o Dr. Antonio Dias e seu grupo chegaram à comunidade dela, diz que mandou ficarem de olho nele.. achou que pudesse ser da polícia enfim, mas depois viu que era uma pessoa boa, querendo ajudar. Alias garante que os traficantes não ligam pra quem quer ajudar os viciados, por exemplo, pois acreditam que eles simplesmente não têm salvação!

“Não desista de falar para o viciado que ele pode melhorar, incentive-o a mudar, mas não se esqueça de mostrar a ele como ele está... mas sem violência, pois ele está anestesiado, não sentirá nenhum tipo de agressão, mas lá no fundo vai refletir sobre o que você diz até resolver parar e procurar ajuda”.

Fé: é aquilo que se espera, mas não se vê, é muito importante. Antigamente ia escondida, armada para a Igreja, mas mudou seu comportamento, sua vida, e hoje continua indo, mas largou o vício.


A.Dias:

Todos somos iguais, e quando despertamos a consciência abrimos caminho para formarmos nossa identidade, e assim depois ajudar ao próximo. Hoje em dia as pessoas se apegam a diplomas e posição social, mas para que serve isso no final das contas? Para nada se o homem não for HUMANO. Os adictos, por exemplo, melhoram quando se enxergam como pessoa, quando percebem a vida com um olhar construtivo, com uma perspectiva melhor, descobrindo o sentido real da sua existência.

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